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"O caminhão da mudança chegou: a nova ordem mundial do despejo", de Joaquim Ferreira dos Santos, traduzido para o francês.

 

O caminhão da mudança chegou: a nova ordem mundial do despejo

Por Joaquim Ferreira dos Santos

08/11/2020 

Junte tudo que é seu - os comprimidos de hidroxicloroquina, as bíblias de araque que você não leu, os tweets em caixa alta, a bílis escorrendo no canto da boca – e, vá, se mande, faz o que mais dia menos dia se torna inevitável na vida de todo ignorante empoderado. Sai de fininho, o rabo entre as pernas, deste palácio que não te pertence mais. Tudo passa, chegou a hora de pastar longe daqui.

Hoje é você, amanhã será o outro que te arremeda, e esta ordem de despejo que ora aqui se apresenta devia estar pronta, afixada desde sempre, na porta dos fundos dos gabinetes de todos os adoradores da morte, do autoritarismo e do preconceito. O pé na bunda lhes é destino e ponto final, seja na Pensilvânia, Roraima ou Irajá.

Fora, malandragem, com a tralha de tacos de golfe, camisas de time de futebol, piadinhas homofóbicas, caneta Bic, e volta ao condomínio da tua insignificância municipal. O mundo gira, a Lusitana roda, e o caminhão de mudança já está na porta para carregar os cacarecos dourados da cafonice, a máquina de bronzear laranja, a arma embaixo do travesseiro, o muro na fronteira e toda a traquitana maligna da falta de consideração pelo próximo. Deu pra ti, grosseirão!

Os votos demoram a ser contados, alguns chegarão apenas no próximo domingo, outros ainda em dois anos, mas eis que já se fazem evidentes os trovões de volta à civilidade e eles estão mostrando a porta da rua para que você saia sem alguém lhe bater. Prazo de locação vencido. A tristeza não é mais senhoria. Faz as malas, pica a mula, puxa o carro, vaza, sebo nas canelas, rala peito - e não tenha o topete de aparecer tão cedo.

Deixa as emas na santa paz laica do quintal. De resto, encaixota os demônios vermelhos com que você assustava a vizinhança. Leva também a seringa para injetar desinfetante na veia dos seus doentes, a luz ultravioleta para combater o vírus da família e todas a cristaleira de mentiras, decretos de incentivo ao caos, ao tiroteio, ao golden-shower e ao uso do leite moça no recheio do pão.  

Desta vez não é uma gripezinha, é o cartão vermelho, o fim de jogo e o suspiro aliviado por quem já vai tarde. Os supremacistas, os milicianos, a Fox News, os guardiões dos hospitais, os juízes conservadores, os generais de pijama, todo esse exército de homens de bem, com Deus no peito e a suástica no coração, foi insuficiente para convencer os demais inquilinos de que o ódio seria bom pastor e vizinho. Hoje não tem cantoria de pastor gospel, mas a decisão unânime dos moradores - você está despejado!

Pela vulgaridade ideológica, por falar aos gritos, palavrões aos berros, desprezar máscaras, gays, negros, mulheres e todos os funcionários do palácio. Posto isso, enquanto não se faz obrigatória aos governantes a vacina do bom senso, a assembleia aqui reunida resolveu aplicar em vossa ex-excelência este artigo primeiro, parágrafo único, da lei internacional do ponha-se-no-olho-da-rua. Favor deixar a chave na portaria e pagar os atrasados. Atenção: o condomínio não aceita dinheiro vivo.

 

Disponível em: https://blogs.oglobo.globo.com/joaquim-ferreira-dos-santos/post/o-caminhao-da-mudanca-chegou-nova-ordem-mundial-do-despejo.html. Acesso em: 09 nov. 2020

 

 

 

 

 

 

 

LE CAMION DE DÉMÉNAGEMENT EST ARRIVÉ : LE NOUVEL ORDRE MONDIAL D’EXPULSION

 Joaquim Ferreira dos Santos

08/11/2020

Traduction: Ronaldo Legey

 09/11/2020.

 

Rassemble tout ce qui est à toi – les pastilles d’ hydroxychloroquine, les bibles de pacotille que tu n’as même pas lues, les tweets en lettres capitales, la bile qui coule au coin de ta bouche – et va t’en, fous le camp, fais ce qui un jour ou l’autre sera inévitable dans la vie de chaque incompétent qui tient les rênes du pouvoir. Pars en douce, sans tambour ni trompette, la queue entre les jambes, quitte ce palais qui n’est plus à toi. Tout passe et l’heure est arrivée d’aller brouter loin d’ici.

Aujourd’hui c’est ton tour, demain ce sera le tour d’un autre qui te singe, et cet avis d’expulsion qui à présent se trouve ici devrait être toujours prêt à l’emploi, affiché depuis toujours sur la porte arrière des cabinets de tous les adorateurs de la mort, de l’autoritarisme et du préjugé. Le coup de pied au cul c’est leur destin : un point c’est tout, que ce soit en Pennsylvanie, Roraima ou en Irajá.

Dehors, espèce de roublard, avec tout ton attirail  de cannes à golf, de chemises de foot, de blagues homophobes, de stylos à bille, et retourne au condo de ton insignifiance municipale. Le monde tourne, la Lusitana Déménagements circule, et le camion de déménagement est déjà à ta porte pour transporter les babioles dorées de ta ringardise, la machine de bronzage orange, le pistolet sous l’oreiller, le mur construit à la frontière, et toutes ces bagatelles malveillantes qui résultent du manque de considération envers autrui . Ras le bol, grand grossier !

Les votes demandent du temps pour être dépouillés, quelques-uns n’arriveront que dimanche prochain, d’autres, dans deux ans encore, mais voilà que les coups de tonnerre annonçant le retour à la civilité se font déjà évidents et ils montrent la porte principale pour que tu sortes sans qu’on te frappe. Le bail est à sa fin. La tristesse n’est plus la propriétaire. Fais tes valises, dégage, sors, va t’en, file, pars le plus vite possible – et n’aies surtout pas du culot de te montrer ici de si tôt.

Laisse les nandous d’Amérique en paix, la douce paix du jardin. Du reste, emballe les démons rouges qui te faisaient peur au voisinage. Emporte aussi la seringue pour injecter du désinfectant dans la veine de tes malades, les lampes à rayons ultraviolets pour combattre le virus de la famille et toutes les sortes de mensonges, de décrets qui incitent au chaos, à l’échange de coups de feu, au golden-shower et à l’usage du lait concentré sucré comme farce au pain.

Cette fois-là, ce n’est pas une toute petite grippe, c’est le carton rouge, la fin du match et le soupir soulageant qui dénote le bon débarras. Les suprémacistes, la milice criminelle, la Fox News, les gardiens des hôpitaux, les juges conservateurs, les généraux retraités, toute cette armée d’hommes de bien, avec le Bon Dieu dans la poitrine et la croix gammée au cœur, a été insuffisante pour convaincre les autres locataires que la haine serait un bon pasteur et un bon voisin. À l’heure actuelle il n’y a plus de musique gospel du pasteur, mais la décision unanime des habitants – tu as été viré.

Par ta vulgarité idéologique, par le fait de parler en criant, par les gros mots dits en hurlant, par le mépris de l’usage de masques, le rejet des gays, des noirs, des femmes et de tous les fonctionnaires du palais. Ceci dit, tant qu’on ne rend pas obligatoire le vaccin du bon sens appliqué à ceux qui nous gouvernent, l’assemblée ici réunie a décidé d’appliquer sur votre ex-excellence l’article premier, alinéa unique, de la loi internationale du mettre à la porte. Prière de laisser la clef chez le concierge et d’acquitter les arriérés. Attention : l’administration n’accepte pas d’argent comptant.

 

 

 

 

 

 

 

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